O maior estudo de uma vacina contra a dengue, conduzido no Brasil e em outros quatro países da América Latina, apontou que a imunização, em fase final de testes, tem 60,8% de eficácia contra a doença. O resultado foi publicado no periódico New England Journal of Medicine e apresentado no encontro anual da Sociedade Americana de Medicina Tropical e Higiene, que ocorre em Nova Orleans. A Sanofi Pasteur, laboratório que desenvolveu a vacina, pretende comerciá-la já em 2015.

Este é o melhor resultado de uma imunização contra a dengue já obtido. Outros estudos com essa mesma vacina, desenvolvidos anteriormente na Ásia, haviam apontado eficácia entre 30% e 56,6%.

A taxa de sucesso, porém, ainda desperta dúvidas quando comparam-se outras vacinas, como a da febre amarela, cuja eficácia é de mais de 90%.

O estudo de fase 3 (última etapa antes da aprovação por uma agência reguladora) da vacina envolveu mais de 20 mil crianças e adolescentes de 9 a 16 anos em cinco países da América Latina: Brasil, Colômbia, México, Honduras e Porto Rico.

O número de participantes é o dobro do de outro estudo de fase 3 dessa vacina conduzido na Ásia. A vacina foi oferecida em três doses, com intervalo de seis meses. Os participantes foram então acompanhados por dois anos.

Proteção parcial

A eficácia geral da vacina foi de 60,8%, mas variou bastante conforme o sorotipo e o país. A proteção foi maior para os sorotipos 3 (74%) e 4 (77,7%) e menor para os sorotipos 1 (50,3%) e 2 (42,3%).

Para Esper Kallás, infectologista da USP que participa dos ensaios clínicos de uma vacina nacional contra a dengue, produzida no Instituto Butantan, a vacina da Sanofi Pasteur tem eficácia de baixa a moderada.

É um resultado importante que nos ajuda a entender o desenvolvimento de uma vacina contra a dengue, mas acho que ainda não está no ponto ideal", diz. Ele lembra ainda que a proteção foi maior –83,7%–entre os que eram soropositivos, ou seja, já eram imunes a um ou mais sorotipos, contra 43,2% de proteção entre os soronegativos.

"É um dado preocupante para a população que nunca teve dengue. Você pode acabar criando um grupo mais suscetível a dengues secundárias mais graves." Isso porque a vacina não protegeria totalmente e ainda poderia fazer o organismo entender que já contraiu a doença.

Sheila Homsani, gerente do departamento médico da Sanofi Pasteur, afirma que esse é um risco teórico que não foi comprovado no estudo, já que houve apenas um caso de dengue severa no grupo que tomou a vacina, contra 11 casos no grupo placebo.

No Brasil, a proteção foi de 77,5% entre os participantes que tomaram pelo menos uma injeção. A fabricante não informou qual foi a taxa entre os que tomaram as três doses nem qual foi a proteção por sorotipo no país.

Durante o período do estudo, porém, o sorotipo que mais circulou foi o 4, para o qual a eficácia da vacina é maior. No México, onde circularam os sorotipos 1 e 2, a eficácia foi de 31,3%.

Para Nicholas Jackson, diretor do departamento de pesquisa em vacina contra a dengue da Sanofi Pasteur, o desafio da vacina contra a dengue é maior, porque trata-se de quatro imunizações em uma. "Não há tratamento específico contra a dengue hoje, não temos outras opções. Por isso, a vacina é um grande marco para a saúde pública", disse.

Fonte: Folha de S.Paulo