Pesquisadores da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP de Ribeirão Preto (SP) fazem testes para confirmar se um anti-inflamatório comum já encontrado em farmácias pode ser usado para curar casos de envenenamento por escorpião.

Atualmente, o tratamento para a picada do bicho é realizado com soro do veneno, e apenas em casos graves, como o do estudante Lucas Bidinelli Filippin. Aos 9 anos, ele sofreu 16 paradas cardiorrespiratórias após ser picado por um escorpião amarelo, um dos mais venenosos.

"Eu fui colocar a chuteira, mas não sabia que o escorpião estava lá. Na hora que eu coloquei, eu já senti a picada. Começou a doer na hora, meu pé começou a formigar, fui deixando de sentir o pé, parecia que eu estava sem a perna", relembra o menino.

Os pais contam que Lucas foi levado imediatamente para um posto de saúde em estado crítico, apresentando sudorese, pressão baixa e dores fortes em toda a perna. Segundo a mãe, Regiane Bidinelli Cabral, o menino tomou seis doses do soro e precisou ser internado.

"No final da tarde, quando estava praticamente bem, ele teve algumas alterações de batimentos cardíacos, passando de 200 por minuto. Ele vomitava muito, ficou praticamente 17 dias internado no hospital e teve pneumonia", contou Regiane.

Pesquisa

Testes feitos pela USP em Ribeirão em animais mostram que um medicamento vendido normalmente nas farmácias foi capaz de aliviar esses sintomas. Segundo a pesquisa, pode, inclusive, reverter casos mais graves que causam edema pulmonar.

Agora, os pesquisadores aguardam autorização do Conselho Nacional de Saúde (Conep) para fazer os testes em seres humanos. Se comprovada, a adição ao tratamento poderá até reduzir os casos de mortes pelo veneno do escorpião.

Segundo a coordenadora do projeto Lúcia Helena Faccioli, a equipe estuda o assunto há cinco anos e no último ano e meio passou a analisar os quadros mais graves, que geram edema pulmonar e ativam os processos inflamatórios.

"Nós comprovamos que o veneno do escorpião libera substâncias que causam o edema e este, por sua vez, ativa os processos inflamatórios. Se eu inibo essa substância com o anti-inflamatório, eu inibo a ativação da inflamação", explicou.

Tratamento visa pacientes graves

Se os pesquisadores obtiverem os mesmos resultados com pessoas, o próximo passo será incluir a medicação como protocolo dos pacientes envenenados no pronto atendimento. "Ele é um anti-inflamatório. E se tomado rapidamente depois da picada, a expectativa é que o quadro seja revertido", disse a professora.

A pesquisadora Karina Furlani diz que pacientes considerados graves e tratados com o soro antiescorpiônico, às vezes, podem sofrer reações alérgicas fatais. "Esse achado poderá prevenir essas reações. Se comprovado esperamos que o paciente picado vá às unidades de emergência e tome o anti-inflamatório em conjunto com o soro para evitar a gravidade".

Atualmente, o medicamento é aplicado apenas nos casos considerados graves e gravíssimos. Os sintomas da picada do escorpião são vômito, sudorese, insuficiência respiratória, desorientação, alteração da frequência cardíaca e da pressão arterial. A pessoa que sofreu a picada também poderá ter insuficiência cardíaca e edemia pulmonar aguda devido à grande liberação de adrenalina.

Caso os resultados sejam positivos para os humanos, o anti-inflamatório passará a ser usado em conjunto com o soro para evitar as complicações. "Isso bloquearia, principalmente, o edema pulmonar e as reações mais agressivas do envenenamento e podendo evitar a morte, que é o foco do nosso trabalho", ressaltou Karina.

Alívio

A equipe de pesquisadores diz que está confiante dos resultados e espera ajudar principalmente crianças com idade até 10 anos, que são consideradas mais frágeis ao veneno. Com isso, esperam que histórias como a de Lucas possam se tornar cada vez mais raras.

"Passei dias tristes de aflição. Então, tenho que dar os parabéns aos médicos, ao pessoal que está correndo atrás dessas pesquisas. Eu acho que realmente não pode parar, tem que correr atrás, por que são vidas e a gente só fica ciente quando acontece com a gente", apoiou a mãe Regiane.

Fonte: Portal G1